Copa de bossa nova

[O Detective Selvagem]

 

Hélder Beja

 

O futebol tem um país que é o país do samba e o país verde-amarelo. O futebol se escreve assim: Pelé. Assim: Sócrates. Assim: Romário. Assim: Ronaldo fenómeno. Assim: Rivaldo, Ronaldinho Gaúcho, Robinho, Neymar. O futebol é felicidade de rua e essa rua é o Brasil.

 

O Brasil iniciou nesta sexta-feira (23/05), nas 12 cidades-sedes, uma verdadeira operação de guerra para garantir a segurança pública durante a Copa do Mundo. Entre os principais equipamentos empregados estão 30 robôs antibomba controlados à distância, lança-mísseis, drones, câmeras que reconhecem até 400 rostos por segundo, além de 5 mil máscaras contra gás inspiradas no vilão Darth Vader, de ‘Guerra nas Estrelas’, para policiais usarem durante manifestações.

 

O iPhone canta e conta Caetano Veloso. São 27 álbuns, 318 canções. As canções que me levarão no Brasil, porque navegar é preciso, viver não é preciso. Canções de muita gente apagada pelo tempo, nos papéis dessa lembrança que tão pouca me ficou. Canções de igrejas brancas, luas claras nas varandas, jardins de sonho e ciranda, foguetes claros no ar. Clarice é o mistério que Caetano canta, assim tão firme no coração. Os olhos verdes da mulata, o luar do sertão.

 

O governo federal disponibilizou o maior efetivo da história de todas as Copas. Serão 170 mil agentes entre policiais, militares e segurança privada. Desse total, 57 mil fazem parte das Forças Armadas. O efetivo será 20% maior do que os 140 mil homens usados no Mundial da África do Sul, em 2010. No total, o Brasil vai gastar 1,9 bilhão de reais para garantir a segurança no evento.

 

Ir no Brasil de Chico, de Vinicius, de Machado e Guimarães Rosa é sonho de menino. Se a bola fosse mulher, no começo Caetano diria: quem vê assim pensa que você é muito minha filha, mas na verdade você é muito mais minha mãe. Não é a língua que é pátria desses portugueses e brasileiros, mas essa redondinha rolando no relvado. Lá fora, amor, uma rosa nasceu.

 

O país também vai receber mais de 200 policiais estrangeiros dos 31 países que classificaram suas seleções para o Mundial, além de mais 15 nações que não vão mandar suas seleções, mas que são consideradas relevantes para o Brasil no quesito segurança da Copa. O reforço, que não terá poder de polícia, seguirá o padrão de megaeventos esportivos internacionais e auxiliará as forças de segurança brasileiras dentro e fora dos estádios.

 

Eu quero ir no Brasil, minha gente, eu não sou daqui. Eu não tenho nada, quero ver Irene rir, quero ver Irene dar sua risada. Irene não é mulher e é todas as mulheres e todos os estádios. Se a bola fosse mulher, agora Caetano diria: podemos ser amigos simplesmente, coisas de amor nunca mais. O povo grita pela bandeira mas ela não atende. Carolina, nos seus olhos fundos guarda tanta dor, a dor de todo esse mundo. Eu já lhe expliquei que não vai dar. E a Copa, vai dar?

 

Apesar das críticas sobre os gastos, para muitos excessivos, o governo federal diz que o dinheiro gasto na compra de equipamentos e treinamento de homens das Forças Armadas e das Polícias Militares vai se transformar em legado para o país após a Copa do Mundo, com a possibilidade de ser usado na segurança de novos eventos, como os Jogos Olímpicos de 2016.

 

Se a música salvasse tudo e a Copa também (mas não salva), Caetano diria: eu vou fazer uma canção para ela, uma canção singela, brasileira, para lançar antes do carnaval. Ele sabe que não vai dar, ou que vai dar doendo, que é quase a mesma merda. E diz: vou-me embora para o sertão que eu aqui não me dou bem, ó viola.

O futebol não mora na filosofia. Então, pra quê rimar amor e dor?

Standard

Leave a comment