Pedro Galinha
Comecemos pelo fim. O filme “2049” termina com um grupo de jovens que, depois de recuperar a consciência, deposita uma flor morta na Cápsula do Tempo.
O simbolismo da cena, segundo os autores do projecto (universitário, é preciso que se diga), transporta-nos para uma sensação de certo saudosismo pelos tempos que antecederam a transferência de soberania. Dizem os jovens, com idades entre os 20 e 23 anos, que, por essa altura, havia “humanidade” em Macau.
Não vivi os tempos da Administração portuguesa, nem tampouco posso julgá-la. Certo é que o presente e o futuro desta que é a minha nova terra poderia ser bem melhor.
“Perdida a autoridade dos portugueses, nos 50 anos seguintes, a dúvida está em saber se construímos ou se destruímos Macau. A máscara que os personagens usam nessa cena final significa que Macau se sacrificou a si própria, está a morrer como a cidade. Se quisermos mudar as coisas tarde demais, já tudo acabou. Será muito tarde para perceber o que aconteceu e, definitivamente, tarde demais para mudar”, contou o realizador Perry Fok, em entrevista ao PONTO FINAL.
Na morte lenta que os jovens decidiram ficcionar, entram o autoritarismo, os subsídios, a poluição, o trânsito infernal, a pobreza e questões de identidade, como a língua. Enfim, há pano para mangas e o propósito da película passa por fazer com que quem vê o produto final possa “reflectir” sobre aquilo que queremos no futuro.
Quem parece não pensar da mesma forma – sobre o meio de contribuir para um espaço social mais digno – são os deputados, que, na semana passada, tiveram intervenções absolutamente ridículas no hemiciclo. Em causa estavam seis projectos de lei assinados por José Pereira Coutinho.
Alguns, sim, eram pouco precisos e mereciam mais trabalho de casa. Mas, apesar de tudo, poderiam ser o primeiro passo para uma discussão séria, que a Assembleia parece não querer ter.
O tempo, alegaram os “colegas” de Coutinho (além de o acusarem de ter pretensões eleitoralistas), foi a barreira que travou a sua iniciativa legislativa, que é uma tarefa a que a maior parte não parece ser muito dada. No entanto, uma das propostas tinha apenas um artigo em discussão e não dava grande azo a atrasos ou contradições, já que em causa estava a dignidade humana.
Urge regular – traduzindo, proibir – a exibição dos detidos encapuzados, nas conferências de imprensa que têm lugar na sede da Polícia Judiciária. É o mínimo, num território que ratifica convenções de direitos humanos.