Os critérios de vida que nos são transmitidos pela Sociedade actual são de tal maneira diferentes daqueles que são proclamados no Evangelho deste Primeiro Domingo da Quaresma que até nos deixam perplexos, quase confundidos. Na verdade, neste Mundo em que nos movemos, se olhamos à nossa volta, com alguma objectividade e profundidade, apercebemo-nos logo de que, certos modos de estar e viver estão já fortemente enraizados nas vidas das pessoas. Há que reconhecer, no entanto, que estão longe de reflectir o espírito das palavras de Jesus Cristo, Mestre e Senhor.
Constatamos que esta sociedade contemporânea está a tornar-se numa ‘Sociedade de consumo e abundância’, de apetite cada vez mais devorador e incontrolável; está a converter-se numa Sociedade de conforto e lazer até à moleza moral, sem objectivos superiores na sua existência, sem visão rasgada nem criatividade na sua actuação; e, por fim, está a transformar-se numa Sociedade compulsivamente dominada pela diversão e prazer, que, historicamente falando, é o caminho mais rápido para originar e desenvolver o tráfico e exploração da pessoa humana e lançar, na humanidade, um número cada vez maior de homens e mulheres no terrível vazio interior, acabando todos por chegar, aos poucos, à desilusão e a afundar-se no desespero!
Ao mesmo tempo, a sociedade em que vivemos está a tornar-se, assustadoramente, uma ‘Sociedade de Luzes de Ribalta’, dominada pelo espectáculo e exibição, cercada de muitos holofotes, de câmaras de televisão e de filmar, coberta de passadeiras vermelhas e habitada por tanta elegância cosmética, de sorrisos Colgate e perfumes que nem a rainha do Sábá poderia adivinhar quando visitou o Rei Salomão.Com
tanta procura de Glória, vejamos o que aconteceu àquele tão célebre e quão poderoso produtor cinematográfico, um magnate… ‘E tudo o vento levou…’
Por fim, a sociedade actual, governantes e povo, continua a insistir e a valorizar o critério e o modelo da ‘Superpotência’. Sim, vivemos numa ‘Sociedade das Superpotências’ em que a autoridade se revela, frequentemente, como uma manifestação de poder e domínio sobre os outros em vez de serviço para bem de todos. Nela conta mais o poder político, o poder económico, e, infelizmente, verdade seja dita, o poder militar em vez de o de procurar o bem da Humanidade.
Brada aos Céus, ouvir aquele Presidente, dias atrás, em visita oficial, afirmar, perante, milhares e milhares de pessoas: ‘Nós temos o melhor arsenal bélico do mundo!…Os melhores tanques de combate,… os melhores helicópteros, os melhores aviões bombardeiros, …os melhores porta-aviões… Vamos fazer um acordo…um negócio…’.
Tal como um outro Presidente que dizia: ‘Façamos a guerra para obter a Paz…’
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Jesus Cristo, o Mestre Divino, segue um ‘Caminho’ completamente diferente daquele que a Sociedade actual defende. Afirma uma ‘Verdade’ para além de todos os critérios humanos. O próprio texto do Evangelista São Mateus chama «Tentações» àquelas primeiras inclinações, que parecendo muito humanas e naturais, não passam, afinal, de artimanhas finamente subtis, vindas do espírito Mal.
Embora « o pão» seja um elemento básico para subsistência humana, contudo, a felicidade, neste mundo para além do pão e, com ele, entendido os bens materiais, o dinheiro, a riqueza…: « Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus».
De igual modo, a presença, a simpatia, o carinho, o amor e a protecção dos outros são expressão e parte natural e estruturante da nossa relação com os outros. Todavia, por mais difícil e dolorosa que seja a situação neste mundo, jamais se deve esquecer que Deus é o meu Senhor e Criador: «Não tentarás o Senhor teu Deus». Nunca cair na «Tentação» de se deixar seduzir pela aceitação, apreciação e «glória» deste mundo. Sempre superficial e enganadora. Deus não esquece um copo de água oferecido a quem está em necessidade. Como nenhum cabelo da nossa cabeça cai sem o seu conhecimento ou consentimento.
Finalmente «Adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele prestarás culto», diz o texto evangélico. Aqui aborda a questão do «poder.» Todos somos frágeis. Todo o nosso viver neste mundo tem um fim. Mesmo todos aqueles que são investidos de autoridade devem estar cientes de que todo «poder» terminará, um dia, e de reconhecer, ao mesmo tempo e humildemente, que todo «o poder» corrompe.
Difícil é falar deste modo, no actual contexto da geopolítica mundial. O exercício da autoridade e do poder é um serviço e para o bem de todos. Não é para, pessoalmente, ganhar riqueza, prestígio e domínio. Portanto, não é de admirar o ver-se cada vez mais violência entre povos e nações
Que a autoridade seja exercido para o Bem de toda a Humanidade e Glória de Deus.
Luís Sequeira, sacerdote e antigo Superior da Companhia de Jesus de Macau