Macau 462 anos e RAEM 20 anos:

Partindo da aceitação da data histórica da fundação e reconhecimento de Macau como espaço da presença portuguesa em 1557 (outros há que a remetem para 1553, apesar de não ser consensual) seria talvez importante também deixar este registo de mais de quatro séculos e meio de vida que Macau transporta, no ano em que, um pouco por todo o lado, se comemoram os 20 anos da RAEM/Macau, ficando no ar, essencialmente para os menos atentos e informados, a quase generalização de que Macau tem apenas 20 anos de existência.

Para todos nós que aceitámos integrar e aderir às comemorações dos 20 anos da RAEM/Macau, onde substantivamente se pautou pela produção de títulos mencionando Macau 20 anos (nalguns caso com o advérbio de tempo, 20 anos depois), proliferou um pouco por todo os “media” a ideia de que Macau comemorava os seus 20 de existência, quando na realidade apenas nos referíamos à RAEM enquanto realidade intrínseca à criação do novo modelo governativo da região tutelada pela República Popular da China.

De qualquer modo o resultado foi extremamente útil e vantajoso para enaltecer e aprofundar as ligações a Macau por parte de Portugal e dos portugueses que viram assim renascer a popularidade de Macau na sua agenda mediática. Afinal Macau existe e subsiste como elemento integrador da herança e do legado lusófono mantendo-se viva e pulsando a “chama” da portugalidade nas várias referências que as comemorações da existência da RAEM vieram a colocar, quer aqui em terras lusas, quer nos eventos dinamizados no território de Macau.

Quis também o destino fazer coincidir o «Encontro das Comunidades Macaenses» com o período da celebração a registar, relançando a visibilidade e a particularidade desse grupo étnico que faz parte dos 462 anos da história de Macau, talvez o único elemento distintivo que não se podia adjudicar (apesar de o integrar) aos 20 anos das celebrações e que muitos (alguns) teimam em perpetuar como traço de diferenciação do «modo de vida» de Macau no presente.

A sobrevivência e a continuidade da afirmação identitária do «macaense» como elemento integrante da sociedade de Macau, foi tema de fundo nestas celebrações, quer aqui em Portugal quer em Macau, e quem sabe também um pouco noutros pontos da diáspora, situação peculiar e transversal que integra a dinâmica dos 20 anos da RAEM como continuidade e extensão de um processo que contabiliza os seus 462 anos de existência.

Será porventura a existência desse traço unificador que baliza e envolve a dinâmica da RAEM como uma continuidade em curso e não como uma ruptura com o passado, isto apesar da sua plena integração na realidade da República Popular da China que a vai absorvendo nos seus grandes planos estratégicos e de modernização.

Quase que em paralelo arriscaria também aqui integrar e realçar, na mesma linha de análise, a presença dos portugueses em Macau nestes 20 anos, também como continuidade de um processo que se prolongou ao longo dos 462 anos, a data de 20 de Dezembro de 1999 assinala a constituição da RAEM e a viragem do modelo político de governação, mas não a desvinculação da presença de portugueses que ao longo destes tempo continuam a marcar essa singularidade que se vai perpetuando com uma nova vaga de residentes.

A combinação destes dois factores permite-nos, por enquanto, realçar uma narrativa de quotidiano que é reforçada por um «modo de vida» peculiar e singular, onde a tutela do novo regime da RAEM mesmo percorrendo o seu percurso de integração plena na República Popular da China se vai imiscuindo com o processo histórico feito pelas pessoas que nela vivem.

Assim, por esse motivo, talvez seja bom recordar e realçar que nestas celebrações dos 20 anos da constituição da RAEM os mesmos sejam também parte da história dos 462 anos de Macau. Resta-nos esperar pelos anos vindouros e ver o que o futuro nos traz, porém até lá quer portugueses quer macaenses continuam a escrever algumas das páginas singelas da história de Macau.

Votos de um excelente ano de 2020.

 

Carlos Piteira

Investigador do Instituto do Oriente

Docente do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas / Universidade de Lisboa

 

 

 

 

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Carlos Piteira

Investigador do Instituto do Oriente

Docente do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas / Universidade de Lisboa

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